Fonte: Portal Exame
Jogar pedras no McDonald's entrou para o rol de passatempos prediletos dos franceses no final dos anos 70, quando a rede de fast food chegou ao país. Na capital mundial da alta gastronomia, a ideia de uma rede americana de lanchonetes prosperar vendendo hambúrgueres, batatas fritas e sundaes feitos e degustados às pressas já foi tachada de tentativa de invasão cultural e serviu de pretexto para protestos de ativistas antiglobalização. Em 1993, o movimento da rede para a abertura de um McDonald's na torre Eiffel foi recebido como um insulto nacional e até o vice-prefeito parisiense na época, Jean Tiberi, tirou uma casquinha do caso, negando a permissão de abertura da loja. Aos poucos, porém, Ronald McDonald e sua trupe conseguiram o aparentemente impossível: fazer com que o sensível paladar francês digerisse melhor o fast food. Sinal dos novos tempos é a inauguração de uma lanchonete da rede em outro cartão-postal do país, o museu do Louvre, prevista para dezembro. As obras ocorreram num clima de tranquilidade e ninguém no país encarou a iniciativa como uma nova queda da Bastilha.
Nos últimos anos, o McDonald's não apenas venceu o clima hostil a seu negócio como transformou a operação francesa numa das mais lucrativas e bem-sucedidas do mundo. O McDonald's francês é hoje a filial mais lucrativa da empresa, perdendo apenas para a matriz, nos Estados Unidos. A unidade instalada na avenida Champs-Elysées, em Paris, ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de rentabilidade. Os clientes franceses são também os que mais gastam: em média, deixam 15 dólares a cada ida à lanchonete, ante 4 dólares dos americanos. No ano passado, o McDo, como a rede americana é conhecida na França, inaugurou 25 novas lojas no país -- número expressivo, ainda mais se comparado com a quantidade de restaurantes que cerraram as portas no país em razão da crise. Segundo dados do Insee, órgão de estatística do governo, só no primeiro semestre de 2008, 3 000 restaurantes franceses independentes entraram com pedido de falência.
A virada do McDonald's ocorreu nos anos 90, sob o comando do francês Denis Hennequin, presidente da operação da rede no país entre 1996 e 2004. "Para fazer o McDonald's e o Big Mac funcionarem no país do slow food, tínhamos de prestar mais atenção em nossos espaços", afirmou Hennequin numa entrevista ao The New York Times. Ele colocou em execução estratégias como a sofisticação do ambiente das lojas, que receberam poltronas e pisos de madeira, e adaptou o cardápio, adicionando ao menu ingredientes locais e pratos tradicionais da culinária local. Adorado pelos franceses, o lanche croque monsieur ganhou uma versão na rede, o Croque McDo. Outro sanduíche criado especialmente para os gostos locais, o Le P'tit Moutarde vem com hambúrguer, pão ciabatta e molho especial de mostarda. As sobremesas do McCafé incluem dois clássicos nacionais, brioches e macarons. Paralelamente às renovações de cardápio e instalações, a rede digladiou com seus opositores. Para se defender dos críticos franceses que afirmavam que seus produtos eram de baixa qualidade, por exemplo, o McDonald's fez anúncios na imprensa que mostravam que a maior parte dos ingredientes vinha de fornecedores locais, além de mostrar sua importância como empregadora.
Hennequin venceu -- pelo menos até agora. As vendas cresceram e o número de lojas passou de 400 em 1998 para mais de 1 100 hoje. Seu trabalho chamou a atenção na sede do McDonald's, em Oak Brook, Illinois, e ele logo foi convidado a expandi-lo para o resto da Europa -- hoje dirige as operações de todo o continente. Além do trabalho de conquista dos clientes, o McDonald's se beneficiou das mudanças nos hábitos de alimentação na França. Nas últimas décadas, a vida apressada tem feito os franceses dedicarem menos tempo às refeições. A duração de uma refeição caiu de 1 hora e 22 minutos em 1978 para 38 minutos em 2008. Mais recentemente, a crise financeira deu um impulso extra ao McDonald's. Como na recessão as pessoas comem menos fora de casa, e, quando saem, escolhem lugares baratos, suas lanchonetes tornaram-se uma opção atraente -- até mesmo para alguns dos franceses mais ressabiados e orgulhosos.
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